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"O que os olhos veem o coração sente", Ana Paula G. Figueiredo, Revista Hermes vol. 4 - Instituto Sedes Sapientiae SP, 1999

A visão é hoje um dos sentidos mais solicitados no mundo moderno, devido à intensa estimulação a que é submetida. Somos cada vez mais uma cultura de imagens, cores, movimento. A utilização excessiva e inadequada da visão é frequente, por exemplo, através da leitura, televisão, computador, dirigir. Como consequência, temos uma grande quantidade de problemas nos olhos ocasionando má funcionalidade e uso inadequado dos mesmos, sendo que nossa tentativa de “corrigir” esses problemas é através de recursos técnicos como óculos ou cirurgia. O uso de óculos é cada vez mais ampliado, chegando crianças a utilizá-los mesmo antes da fase escolar.

No inicio do século um oftalmologista de Nova York, Dr. William H. Bates inovou com sua teoria revolucionária. Mostrou basicamente não ser verdadeiro o conceito existente de que os problemas visuais tendem sempre a piorar, podendo unicamente ser minimizados com recursos como óculos ou cirurgias.  Ao contrário, demonstrou que, quando os olhos recebem adequadamente os estímulos naturais de que necessitam, como “LUZ”, “MOVIMENTO”, e “RELAXAMENTO”, problemas visuais de várias ordens podem melhorar sensivelmente. Bates mostrou também a estreita relação entre acuidade  visual e estados de fadiga, ansiedade, e excitação. Nossa visão altera-se e varia de acordo com o estado fisiopsíquico do organismo. Isto é, os olhos fazem parte de nosso corpo como um todo e reagem com ele de uma forma global.

A visão não é estática e o olho não é uma câmera fotográfica que funciona mecanicamente. A visão é primariamente psicológica. “Enxergamos principalmente com a mente e só em parte com os olhos”. Baseado nesse enfoque, Bates propôs exercícios que visam a modificação dos padrões cerebrais com que fomos condicionando nossa visão ao longo dos anos. Trabalhar e relaxar a musculatura ocular, reeducando e corrigindo erros, ao mesmo tempo em que se desenvolvem hábitos corretos necessários à visão adequada é objetivo dos exercícios, simples mas que exigem conscientização e disciplina.

Meir Schneider é um terapeuta que desenvolveu e ampliou o método Bates, a partir da sua experiência com as próprias severas limitações visuais (nascido com catarata, glaucoma e nistagmo, foi alfabetizado em braile). Após muitos anos de intenso trabalho consigo, através de horas diárias de exercícios, conseguiu um grande desenvolvimento em sua visão, a ponto de obter a licença de motorista na Califórnia.

Meir acrescentou ao método Bates um trabalho com todo o corpo, utilizando, além dos exercícios visuais, o relaxamento, a massagem e exercícios corporais, visando um processo de consciência cinestésica e fisiopsíquica que propicie a mudança de hábitos, quebra de padrões mentais, transformando nossa forma de utilizar a visão, e portanto nossa forma de enxergarmos a nós mesmos e o mundo.

“Os olhos são o espelho da Alma”. Enxergamos através da luz que penetra nos nossos olhos e estimula nosso cérebro. Aquilo que conseguimos ver do ambiente exterior tem relação com o que vemos de nosso interior. Há um paralelismo entre o micro e o macrocosmo, entre o universo que chamamos consciente e o inconsciente. Hoje em dia o homem tem grande dificuldade de enxergar mais profundamente ambos, tanto o Universo de que faz parte quanto sua psique interior. O conhecimento do espaço cósmico permanece um enorme desafio – lembremos do telescópio Hubble que teve um problema de “miopia”. E a cegueira para o universo interior e suas necessidades mostra-se em toda patologia individual e social existente atualmente.

Esse distanciamento de nossa Natureza física e psíquica é o que se procura trabalhar nesta abordagem. Estar próximo à natura física, olhar o horizonte, caminhar ao sol, são a base de alguns dos exercícios, que propiciam essa reintegração, esse estar mais profundamente consigo mesmo, ampliado por exercícios como o “palming”-cobrir os olhos com as mãos em concha procurando enxergar o mais escuro possível para obter o relaxamento do nervo ótico. Isto será completado com o “sunning”- deixar o sol banhar as pálpebras cerradas enquanto movemos a cabeça. A boa visão depende da alternância de Luz e Sombra, relaxamento e atividade, e encontramos aí um paralelo com a proposição de Jung da dinâmica dos opostos que regula nossa psique através do equilíbrio entre consciente e inconsciente. Equilíbrio, eis a lei da ação e descanso para os olhos.

Mesmo durante nossos sonhos estamos enxergando, como comprova o REM (Rapid Eyes Movements) e nosso nervo ótico está sendo constantemente estimulado.

Durante o “palming” orientamos a visualização de cores contrastantes como branco ou rosa no fundo preto, além de imagens em movimento e diversas formas. As imagens que surgem nessa fase do exercício tem também um significado simbólico, de acordo com a dinâmica de cada um.

Um outro paralelismo com um tema muito estudado por Jung em relação à psique é o aspecto mandálico presente no olho e na visão. O músculo ciliar que compõe a íris, fazendo a contração e dilatação da pupila é uma mandala dinâmica, com variações individuais de coloração, mas exercendo sempre essa função de abertura e fechamento à luz e ao mundo exterior, analogamente à extroversão/ introversão junguianas.

Há uma estreita correlação entre visão e funcionamento cerebral. A memória é constituída basicamente por imagens. Informações visuais e sensoriais oriundas do cérebro fazem o organismo reagir como diante de estímulos externos. Essa é base dos exercícios de visualização e imaginação utilizados em muitas áreas e em nossos trabalhos com visão. Esses exercícios tem tradição em antigas práticas orientais (Bates pesquisou o yoga tibetano para desenvolver seu trabalho), e hoje em dia, com a evolução de novo paradigma da ciência, trazido pela integração da cultura oriental e dos princípios da Física moderna, caminha-se no sentido de superar a falsa dicotomia entre matéria/energia, corpo/mente, sujeito/objeto, no que poderíamos denominar a integração dos opostos proposta também na teoria da psicologia analítica de Jung.

“Nós não vemos as coisas como elas são, mas sim como nós somos” – Anais Nin, escritora francesa.

Cuidados básicos para os olhos:

  • Evitar na medida do possível o uso de óculos.
  • Usar ao máximo a luz natural.
  • Evitar fixar o olhar; mudar o foco, olhando para longe e para perto.
  • Piscar constantemente.
  • Realizar o “sunning” e o “palming”.
  • Trabalhar a postura, a respiração, o relaxamento com imagens e visualização.

Bibliografia:

SCHENEIDER, Meir. Manual de Auto-cura. São Paulo : Triom.

SCHENEIDER, Meir. Uma Lição de vida. São Paulo: Cultrix.

SANCHES, Mário. Recupere e Conserve seus Olhos. Imery.

PEPPARD, Harold. Veja Melhor Sem seus óculos. (apostilado).

JUNG, Psicologia do inconsciente. Vozes.

JUNG, O desenvolvimento da Personalidade. Vozes.

Publicado na revista Hermes vol. 4.

Instituto Sedes Sapientiae SP ANO 1999.