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Visão Consciente Reeducação visual – um processo consciente

Maria Fernanda Leite Ribeiro

Dizem os poetas que os olhos são a janela da alma. Refletem, através do seu brilho, uma chama reveladora das impressões causadas pela diversidade do mundo.

De fato, a experiência visual é muito mais do que um simples catálogo informativo; ver não é simplesmente filmar o mundo. As imagens penetram um complexo universo interior e são, de pronto, tingidas por seu clima emocional. Atuam em consonância com os outros sentidos e nos devolvem uma interpretação coerente e padronizada do mundo.Tudo isso é modulado por um mecanismo tão sutil quanto poderoso – a atenção.

Se observarmos o comportamento visual de uma criança pequena, veremos em seu olhar um brilho vivo, fruto da curiosidade com que ela examina o mundo. No entanto, muito rapidamente as novidades ficam mais raras; o mundo já não é tão desconhecido e o que antes era objeto de observação ativa se transforma no reconhecimento de formas já conhecidas e experimentadas. Através do sistema motor integrado aos aspectos cognitivos ela constrói o conceito. A partir daí a imagem passa a ficar automática. O trilho está feito; visão passa a ser um reconhecimento a partir de um catálogo de experiências.

Diante da aceleração da vida moderna, há uma longa fila de informações à espera de “um minuto de atenção” para receber a devida apreciação. Conteúdos emocionais conflitantes, pressa, preocupações, excesso de trabalho, provocam uma “atrofia” gradual no ato de aproveitar e desfrutar a impressão que nos chega pelos olhos. Poderíamos falar aqui de uma ambliopia filosófica. Isso para não citar aquelas pessoas que, diante de uma patologia ou ametropia, estão privadas do desempenho fluente da visão desde seu nascedouro.

O método Meir Schneider – Self-Healing desenvolveu meios de potencializar a visão funcional, ou seja, promover o melhor uso do aparato visual através de exercícios e práticas não invasivas, que estimulem a atenção e a percepção visual. É importante frisar que este é um método de reeducação, o que permite trabalhar em todas as instâncias do processamento visual, independentemente da patologia. Nós possuímos um “estoque” de visão pronto a ser explorado.

Os exercícios obedecem a alguns princípios básicos:

  1. Capacidade de observar os menores detalhes possíveis.
  2. Relaxamento visual.
  3. Equilíbrio no uso dos dois olhos.
  4. Equilíbrio entre visão central e periférica.
  5. Capacidade de adaptação a diferentes intensidades de luz.

Seguindo esses parâmetros, numa terapia são sugeridas dinâmicas visuais e corporais com o intuito de quebrar padrões viciados e automatizados de comportamento visual, possibilitando o uso dessa reserva.

Se observarmos uma pessoa lendo um texto sob condições adversas, perceberemos que possivelmente franzirá o cenho e tencionará mandíbulas e pescoço. Deixará de piscar, provocando excesso de fixação. A respiração rasa, ombros levantados; todo o corpo dará sinais do esforço despendido naquela tarefa. Nada de consciência corporal. Muitas vezes ela estará tão distanciada de uma consciência cinestésica que não perceberá nada, nem mesmo quando há dor. É paradoxal, mas a tensão pode também ter um efeito anestesiante.

Diante de um portador de degeneração macular senil, por exemplo, haverá uma disparidade entre o conceito armazenado na memória visual e a capacidade atual de resolução da imagem. Isso faz com que a pessoa focalize a atenção para a perda gradual e constante, exacerbando o conteúdo emocional intrínseco, ao invés de usufruir de alternativas possíveis pela reserva da visão residual. O componente da perda torna-se soberano e devastador.

O segredo reside na modulação da atenção, que só pode ser liberada através da cognição. Na verdade a atenção não é nada mais do que a própria consciência expandida, explicando o poder enorme que se encerra nas técnicas de visualização, parte integrante da maioria dos exercícios de Self-Healing. A visualização revigora a memória visual, ampliando a percepção e o intercâmbio com o fluxo de impressões frescas.

Diante disso a influência passa a ser de cima para baixo. Surge a consciência lúcida, ou seja, o observador ativo.

A emergência do observador ativo permite, por sua vez, que se abra uma brecha no sistema visual. Os neurônios, predispostos para a ação conhecida, são surpreendidos por estímulos inusitados, percebendo a informação como nova e perturbadora, o que leva a uma reorganização. A repetição constante de manobras muito simples, de acordo com os princípios acima citados, gera um padrão de impulsos que, de alguma forma induz a uma resposta visual imediata favorável.

A plasticidade do cérebro, presente de maneiras diferentes ao longo da vida, possibilita a instalação de novos padrões. Assim, podemos ousar dizer que a função condiciona a estrutura, abrindo espaço para um melhor aproveitamento e maior apreciação do ato de ver.


Maria Fernanda Leite Ribeiro é Terapeuta visual – Método Meir Schneider – Self-Healing